Já faz tempo que penso que o
papel do treinador é o de um facilitador para que os atletas obtenham seu
melhor desempenho. A função do treinador esportivo é de extrema complexidade,
visto a quantidade de saberes diferenciados que ele precisa adquirir e
compreender bem para que possa exercer seu trabalho com bom aproveitamento. Diante
disso, penso que muitos treinadores ainda se apresentam com base em antigos
padrões de comportamento tão marcantes no meio esportivo em outros tempos.
O papel do técnico não é “dar
bronca” em seus atletas, e sim orientá-los no sentido de buscar as soluções
para os problemas apresentados durante treinos e jogos. Tive uma experiência
muito proveitosa durante o torneio feminino do Jogos Universitários Brasileiros
(JUB’s) de 2011, realizados em Campinas, SP. Nosso time era formado por atletas
muito jovens e sem nenhuma experiência neste tipo de competição; algumas delas
foram iniciadas na modalidade naquele mesmo ano, poucos meses antes. Não era
viável cobrar resultados numéricos daquele time, mas sim resultados em termos
de atitude, comportamento. A vontade de tentar executar os fundamentos do jogo,
mesmo que o percentual de aproveitamento fosse baixo. Era o início de um
trabalho, e tudo deve acontecer a seu tempo. Na ocasião, fiz uma brincadeira
com as atletas dizendo antes de cada jogo que elas tinham recebido certa
quantidade de “tíquetes de erro” para utilizar ao longo da partida. Isso foi
feito para que elas não se preocupassem em acertar, mas sim em tentar. Cheguei
a receber elogios de um dos árbitros que disse “Você é muito didático com as
meninas. Queria ter mais técnicos assim por aqui!”. Nos anos seguintes, aos
poucos esta exigência deve ir aumentando, mas o treinador precisa saber o
momento e a forma de cobrar. E nunca cobre aquilo que não foi ensinado!
Atletas erram ao longo do jogo
(já escrevemos um texto anterior aqui no blog sobre isso), e em geral, sabem
que erraram. Portanto, enfatizar o erro pode aumentar a barreira para o
rendimento. Vejamos dois exemplos interessantes:
Numa das partidas finais do NBB
2, o time de Brasília, dirigido por Lula Ferreira, vencia o Flamengo por
pequena diferença no placar, quando seu armador Nezinho tentou fazer uma jogada
de efeito e acabou por perder a bola para o defensor adversário, Fred, que fez
a cesta. Imediatamente, Lula parou o jogo com um pedido de tempo. Faltavam cerca
de um minuto e meio para o fim da partida. Agora, o placar dava vantagem de
apenas 4 ou 5 pontos a Brasília. Durante o pedido de tempo, Lula pegou sua
prancheta tática e indicou como seria a próxima saída de bola do time, o que
deveria fazer de movimentação ofensiva e depois como deveria ser sua defesa,
quando a posse de bola voltasse para o Flamengo. Ué, e o erro do Nezinho? Lula
nem tocou no assunto. Não precisava. Nezinho sabia que tinha errado, e sabia
que não era para repetir aquilo. O pedido de tempo debitado dura apenas 60
segundos. Lula optou corretamente por resolver o problema da equipe, e não pelo
destaque do erro cometido. Brasília ganhou o jogo e conquistou seu primeiro
título do NBB. Ah, e não me lembro de outra bola perdida por Nezinho desta
forma.
Em um outro ambiente, durante uma
partida decisiva de um campeonato estadual feminino Sub-17, uma das atletas de
um time vinha tendo um rendimento excelente na partida, defendendo bem, pegando
rebotes, dando assistências, fazendo o jogo rodar no ataque e, fazendo a
maioria das cestas do time. Mas, de repente, ela cometeu um erro de
posicionamento da defesa e perdeu um rebote fácil, que resultou em dois pontos do
adversário mais uma falta pessoal. Sem perder tempo, o técnico deu-lhe uma
bronca publicamente, gritando com a atleta e reclamando da falha cometida. Da
arquibancada, comentei com um colega “Ele acabou de perder sua melhor jogadora!”.
E não deu outra. A bronca abalou a confiança da jogadora que nas posses de bola
seguintes não acertou mais nada. Errou dois arremessos, andou com a bola, errou
um passe, e ainda repetiu o mesmo erro defensivo que originou a bronca. E foi
sua 4ª falta. Saiu do jogo e mesmo quando retornou mais tarde, não obteve o
mesmo rendimento seguro de antes.
O técnico não deve “passar a mão
na cabeça” do jogador que erra, mas deve saber o momento e a forma de
repreendê-lo. Durante a partida, concentre-se em catalisar a performance de
seus atletas, ou seja, busque os meios para que eles mantenham ou adquiram
autoconfiança, e mostre o caminho a ser seguido para que os acertos superem os
erros. O que você fizer ou falar deve servir para melhorar e corrigir a
performance, não para prejudicá-la.
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